Senhor

26 de mar. de 2012


Parou, a trinta dias para sempre, e dorme hoje num cofre de madeira com fechos de ouro, o meu amigo “Baixinho”. Evoco a nossa amizade desde o tempo em que eu, menino ainda, com uns nove anos, trabalhava como ajudante na rota, com o carro do meu pai, na venda de bebidas do deposito E. BRAGA IRMÃO. Era com a alegria de um neto de Correinha (também baixinho), que eu entrava naquelas bodegas dos baixinhos,
localizadas todas na rua Julio Cavalcante, duas na esquina com a 12 de outubro, e duas na confluência com a engenheiro Barreto, onde negociavam os irmãos Raimundo, João, Luis e Senhor. Nascido a 02 de julho de 1941, no Sitio Caieiras, no vizinho município do Icó, já nas fronteiras com o Estado Potiguar. Tomou aos ombros a heróica missão de oferecer
a sua família um futuro mais ameno. Foi assim que, jovem ainda, com apenas 23 anos, chegou ao Iguatu no ano de 1964, estabelecendo-se no Bar Cruzeiro do Sul . Foi nesta bodega, que a custo de muito, sacrifício e trabalho , juntou economias com as quais trouxe através dos anos, seus pais , o casal Jose Soares de Albuquerque e a Sra. Maria Socorro Souza, as irmãs Maria e Amélia, os irmãos João, Raimundo e Francisco.
Casando-se em 1968 com a Sra.Maria Socorro Dantas. Com quem teve seis filhos dos quais quatro foram engolidos pela magra sorte, firmando-se dois, que hoje são os pilares, sustentáculos daquela casa Roberio e Rogério.
Foi no domingo, 26 de fevereiro, que tomei conhecimento da sua morte , o amigo
Jovem, chegou todo arrumado, em sua bicicleta, pilheriei:
-Vai fazer exame de fezes?
-Não! Vou ao enterro do meu amigo Baixinho.
Durante o velório ouvi este depoimento, que por trazer a verdade, sintetiza toda a vida do José.
_ Baixinho chegou aqui, na Julio Cavalcante em 1964 e só abria as portas daquela bodega para fazer três coisas: Vender cachaça, banana e fazer amizade.
Do seu filho Rogério, ouvi este depoimento cheio de orgulho e sofrimento:
_Meu pai era um Homem calado, na dele, não deixava transparecer o que sentia . Não devia nada a ninguém, só fazia o que podia. Pequeno no tamanho mais grande no coração .Ele só vivia achando graça daquela historia da onça que você lhe contou.Então lembrei de um instante, quando fui ao mercantil do Flavio, em frente a bodega do Baixinho e vi lá dentro, o picolezeiro Nazareno , antigo morador da casa do meu avô Correinha, tomando uma cerveja gelada, no balcão , o Baixinho estava sentado com sua senhora, entrei e fui logo, contando :
_ Oh negro valente, este Nazareno, Baixinho!
_Em !?
_Ele já lhe contou a historia da onça?
_Não.
_ Pois duma feita, o Paulo Couras se armou aqui, com um rifle, um revolver, uma cartucheira de bala e uma facão rabo de galo e se botou para o Orós, onde o Nazareno morava, na casa de sua irmã Neile Couras.Chegando lá, foi logo afirmando:
_Vamos Nazareno! Tu não disse, que aqui no Orós, tinha muita onça? Eu vim matar uma. E seguiram os dois, por dentro de umas grotas, grutas de pedras. O Nazareno só levava
um borno , com um pedaço de carne seca , farinha e uma rapadura Depois de algumas horas , já escurecendo ouviu-se um esturro:
- O que é isso Nazareno!?
- O que é isso!? É onça. Você não estava atrás de onça!
Mais algumas passadas, e dessa vez, um rugido maior.Quando levantaram a vista, duas chamas de fogo acessas nos olhos de uma onça, que estava em cima de uma rocha, a um salto deles. Paulo, soltou o rifle, o revolver, o facão e correu. A onça saltou na jugular do Nazareno. Que só teve tempo de lembrar da rapadura que trazia no borno.Enquanto a onça saltava com a boca aberta, os caninos a mostra. O Nazareno lhe desferia uma tapa, com a rapadura na palma da mão, quebrando todos os dentes da onça, mas estourando com sua mão.
- Mostra, a mão ai, Nazareno!
Então, exibiu orgulhoso,a mão aleijada.
Quando este Homem, entrou no Orós, todo aranhado, trazendo a onça sobre os ombros, o povo todo parou, para ver a façanha. Quando ele entrou na casa da neile, o Paulo estava tomando banho no alpendre, todo cagado!
E embaixo de gargalhadas, eu afirmei:
_ Pega Baixinho, na mão de um Homem, que matou uma onça, de tapa!

È esta, a homenagem que presto hoje a José Souza Albuquerque, para os amigos, fregueses, conhecidos “ Baixinho” para os íntimos, familiares, aqueles que aprenderam com ele que, a porta certa, para a verdadeira riqueza, não é aumentar a fazenda.E sim, diminuir a cobiça.

SENHOR.


Tenho dito.



CÌCERO CORREIA LIMA

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