14 de mar. de 2011

Cabalístico


“ Dá- me a tua mão e não me importarei com a distância a ser percorrida . Seguiremos juntos até onde existir vida”. Está afirmação graciosa li num convite de casamento e batizado dos seus quatro filhos, Edimira , João Victor, Edio e Vitoria , enviado a mim pelo casal Cesário e Eliane. A data de tão significativa celebração é o dia 22 de janeiro, na Catedral de Senhora Santana e a recepção a rua José de Alencar n° 641. Tanto a data como o endereço me são próximos, 22 de janeiro, foi o dia em que morreu meu pai José Correia Braga Filho , o endereço na antiga rua do angico, hoje, José de Alencar, é o mesmo endereço do meu avô o velho Correinha, onde atualmente reside o seu neto, meu primo, amigo e compadre Cesário.
A alguns meses , recebi o convite do editor da revista Semanal, o Sr. Afrânio Marques, para que eu escrevesse algo em homenagem ao Velho Correinha, meu avô :
- O espaço esta dado . Quando você quiser ?
Resolvi então, deixar a homenagem para a data do seu aniversario natalino , se vivo fosse, estaria completando a 20 do mês , 117 anos o velho Correinha. Foi no meio a este trabalho, que me chegou as mãos aquele envelope vermelho como o sangue, selado com um coração, simbolo do amor, prometendo união, até onde existir vida, 22 de janeiro, dia da publicação da revista Semanal, dia da homenagem ao meu avô, da morte do meu pai, do casamento do Cesário , do batizado dos seus filhos, agora sim, o Alfa e o Omega , o principio e o fim , a redenção de nossa casa.

Meu Avô

José Correia Braga , conhecido por Correinha, nasceu a 20 de Janeiro de 1894, no Cruiri dos Braga, zona rural do Iguatu, era um homem de pequena estatura, sofrendo de osteomielite , chegou a quebra as pernas 12 vezes , não obstante isso , foi um homem voltado desde a infância ao trabalho , e de uma determinação a toda prova , pois não prevalecendo a sua pequenez e feiura, conseguiu com outros méritos conquistar uma formosa moça , tendo com ela casado e constituído uma numerosa prole de 20 filhos , dos quais se criaram 15. Considerava-se um homem vitorioso , pois conseguira passar de um vendedor de verduras, quando na infância, tornando-se com muito sacrifício e trabalho , um comerciante tradicionalmente festejado , conhecido e querido por todo o povo da região centro-sul do Ceará . A sua casa a rua do Angico era bastante frequentada por pessoas do povo, onde muitos encontravam sempre uma mesa farta onde pudessem aliviar a fome. Costumeiramente dirigia-se ainda pela madrugada, 4hs da manhã, para o seu estabelecimento comercial, de onde só retornava as 4hs da tarde , sempre com os bolsos cheios de bombons , pirulitos , macaúbas que distribuía entre a criançada que o seguia risonha aos gritos de :

-Vovô Correinha ! Vovô Correinha !

Dentre as muitas historias contadas sobre o meu avô , a uma em especial, que nos faz ver bem a coragem e a determinação daquele pequeno grande homem. Apaixonado por Maria Josina da Conceição ( que veio a ser minha avó ), era dizem, uma bela moça , alta , alva e com os olhos mais azuis e lindos que eu já vi , e sentindo as dificuldades impostas pelo pai desta , o Sr. Pedro Felipe Chaves , por não querer a união dos dois, teve uma bela manhã , quando retornava de sua vinda diária a cidade , um encontro com este :

- Meu Compadre Pedro , é verdade que o senhor não faz gosto no meu namoro com sua filha Conceição ?

- É, Correinha .
- E eu posso saber porque ?
- Pode. É que eu não acredito que um cabra do seu tamanho seja homem pra mulher.
- Pois eu sou !

E desabotoando a barguilha, jogou para fora os seus “ possuidos.“
Como resposta ouviu do Sr. Pedro Felipe.
- Não precisa disto não, pode casar, case.

Em virtude do seu pequeno porte físico e do seu comercio diversificado, onde, segundo o povo, encontrava-se ate bainha para foice. Tornou-se uma figura folclórica, pessoas de lugares diversos, de passagem pelo Iguatu, dele não iam embora, sem antes conhecer o comercio do seu Correinha.

O Fogo

Uma noite, contou-me meu irmão Betim, lembro-me bem, era garoto, fomos acordados todos, com um tiroteio e explosões continuas, da varias intensidades. Saímos de casa para ver do que se tratava, a rua estava repleta de curiosos. Via-se bem uma claridade no centro da cidade, um fogaréu enorme. Era o comercio do meu avô que ardia em chamas. Partimos para observar, mas devido as explosões de munições, pólvora, fogos de artifícios e ate dinamite , guardamos uma certa distância do incêndio. Meu avô assistia a tudo sereno, mudo, sem dizer palavra. Um tio meu, jovem ainda, Geraldo Correia Braga, assistia também a cena, e no lance impensado, correu para dentro das chamas, em meio ao tiroteio. Assombro geral, instantes depois, volta em disparada, trazendo consigo um feixe de espingardas. Jogou todas aos pés do seu pai, e fez menção que ia voltar. Segurado por meu avô pela munheca, ouviu dele as seguintes palavras:

Não vá mais, aqui dar para eu recomeçar.
As espingardas que o Geraldo conseguirá salvar do fogo, traziam todas no seu cano a inscrição: Lazarina legitimo de Braga.

Os dois sacos de gergelim.

Contou-me o Sr. Luiz Barbosa, que meu avô tinha fama de grande comerciante, que nunca deixava de fazer um negocio, que o importante para ele era a satisfação do freguês. Um dia um cidadão por nome de Afonso, em tom de pilheria, afirmou:

- Correinha, eu compro tudo que tem aqui dentro, mas só pago cada peça a vintém.

- Tá e feito.

E se dirigindo ao ajudante:

-Compadre João Grande, desça com dois sacos de gergelim que eu tenho ali em cima , que é pra gente começar a contar os caroços.

A caixa de sapato

Num sábado pela manhã, o Sr. João Tubina procurou-o , queria empenha um par de sapatos novo, coisa rápida, só enquanto terminava a feira , iria bancar uma moreninha na porta do mercado, coisa certa, dois palitos:

- Quanto?
- Cinquenta cruzeiros, por sessenta, até o final da feira.

A tarde , voltou lá , pagou o empenho, calçou o sapato e disse que iria passar o resto do dia dançando lá no salão da tia Nilza, inaugurar o sapato. No domingo voltou lá, a caixa de sapato em baixo do braço, o mesmo negocio, só até o final da feira. Meu avô, pegou a caixa , colocou-a na prateleira e lhe passou o dinheiro. Dias depois, um novo freguês, em busca de um par de sapatos :

- Eu tenho um aqui, o João Tubina não voltou mais, vou pegar para você ver.

Ao abri a caixa, verificou surpreso que dentro dela havia uma banda de tijolo.

Comentário do povo.

Em pesquisa, busquei o depoimento de minha tia Frasquinha Ferreira Lima ,natural de Acopiara, nascida a 8 de maio de 1926 :

- Do Correinha meu filho , se ouvia muito o comentário do povo aqui em Acopiara: Se tiver com fome, vá pra casa do Correinha, lá se hospeda todo mundo. Na casa do Correinha , num falta um prato de comida , pra ninguém.

Aiuaba

- O meu avô Nicéas Arrais, vinha muito ao Iguatu, todo artigo de couro, sela, arriação, estribo ele comprava no Correinha. Quando ele Chegava na Aiuaba, sempre nós crianças, queríamos saber historias do Correinha, lá o sonho de toda criança ,era vir ao Iguatu conhecer o Correinha. A primeira vez que meu pai o Sr. Leandro Feitosa, me trouxe ao Iguatu, passamos logo no comercio do seu Correinha. Quem diria que no futuro seria mãe de três dos seus netos, casaria com um filho seu o Antonio.

Depoimento da Sra. Cleide Arrais Jucá.

Zulmira Baby

Ta com uns quatro anos, eu fui a São Paulo, entrei na distribuidora de brinquedos Beija- Flor, para fazer compras para a loja Zulmira Baby. Quando terminei o vendedor me pediu o CNPJ para fazer o cadastro :

- Ah ! A senhora é do Iguatu ? Eu sou do São Bartolomeu, um sitio próximo a cidade, mas a única lembrança que eu tenho de lá é de um anãozinho que tinha no Iguatu, eu não sei se a senhora conheceu , era o Correinha.

- Conheci.
- Pois é , eu e meus dois irmãos tínhamos muita vontade de conhecer o Correinha. Quando meu pai decidiu que viríamos para São Paulo , era um final de safra do ano de 1970 , ele prometeu que quem colhesse mais algodão, iria dar como presente ir ao Iguatu conhecer o Correinha. Foi tão grande o nosso empenho que papai resolveu levar nós três. Chegando no comercio dele , ficamos impressionados , pois para nos atender ele subia num caixote para alcançar o balcão. A senhora lembra deste Correinha ?

- Lembro, sinto até saudade dele. Você viu o nome Correia ai no cadastro de Zulmira Correia Lima?
- Vi .

- Pois este Correia é dele , era meu pai o Correinha .

- Vixe ! E se eu estivesse falando mal do homem. Correinha é a única lembrança que eu tenho do Iguatu.Diante de nossa admiração , boquiabertos na sua frente, saiu- se com esta :
- Querem os documentos ou a fotografia ?

Eterno


Tinha aproximadamente13 anos, quando entrei em disparada , como era costume de uma centena de netos seus, pela casa do meu avô , atravessei a sala grande, entrei pela casa nova , segui para o quarto de minha tia Dejanira onde Vovô estava convalescente de uma queda, onde quebrou uma das pernas. Uma de suas filhas, não lembro qual, estava fazendo um asseio nas suas costas.

- Abenção Vovô ? Isto é ferida ?

- É meu filho.

- E não dói não?

- Dói.

- E o senhor não geme, não?

- Não adianta meu filho, não adianta.

Na hora acreditava que ele estava falando das feridas , hoje com a idade percebo que meu vozinho se referia a vida. E a vida é eterna, e no eterno não a passado, nem futuro , porque no eterno tudo é presente , e o seu nome vovô , estar presente na pessoa do meu irmão José Correia Braga Neto , do meu filho José Correia Braga que ainda hoje corre por tua calçada. PARABENS!!!

Tenho dito

Cícero Correia Lima.

1 comentários:

Unknown disse...

Fala da Família Assunção

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